Em defesa da língua de sinais

Manifestação do GT de Língua de Sinais, da Associação Nacional de Pesquisa e Pós‐Graduação em Linguística (ANPOL) e demais especialistas da língua de sinais, à publicação postada na página da Associação Brasileira de Otorrino‐laringologia e Cirurgia Cérvico‐Facial (ABORL‐CCF)
Os surdos brasileiros estão espalhados nos estados do país e formam a Comunidade Surda Brasileira. Esses surdos usam a Língua Brasileira de Sinais, reconhecida oficialmente por meio da Lei de Libras 10.436, de 2002. É uma língua que apresenta todas as propriedades linguísticas de quaisquer outras línguas humanas, ou seja, por meio dela é possível falar sobre quaisquer assuntos (desde o mais trivial até o mais acadêmico, técnico e científico).
Enquanto doutores especialistas da língua de sinais, precisamos informar às instituições públicas e privadas brasileiras que qualquer comunidade linguística tem o direito de usar sua língua nativa, conforme previsto na Declaração Universal dos Direitos Linguisticos ‐ UNESCO (disponível em: http://www.linguistic‐declaration.org/index.htm).
Conforme a Federação Mundial de Surdos, o Brasil é um dos países que está mais avançado quanto às políticas linguísticas de reconhecimento da língua de sinais pelo país. Portanto, estamos à frente de muitos outros países, por termos uma Lei que reconhece a Libras como língua nacional e um decreto que a regulamenta ações concretas que a legitima (Decreto 5626/2005).
Portanto, a manifestação dos otorrinolaringologistas à REDE GLOBO, dizendo que a utilização da Libras na novela “Cama de Gato” é considerada um “retrocesso” é improcedente! Pelo contrário, a REDE GLOBO, como já fez em outros momentos, está incluindo uma das línguas nacionais do país em suas novelas. Fazendo isso, a REDE GLOBO, além de incluir os surdos brasileiros, usuários da Libras, na sociedade, está reconhecendo o estatuto linguístico social de grupo social minoritário que faz parte do país. Essa atitude é louvável e representa, sim, uma postura atual e atenta à realidade brasileira.
Gostaríamos, ainda, de manifestar que, do ponto de vista linguístico, ser bilíngue, apresenta uma série de vantagens. Os surdos brasileiros com implante ou sem implante coclear, na sua grande maioria, são bilíngues, tendo, portanto, a Libras e a Língua Portuguesa, enquanto línguas. Alguns deles são multilíngues, fluentes em Inglês e Língua de Sinais Americana. Retrocesso é fadar surdos com implante coclear a serem monolíngues, pois, considerando o estado atual de globalização em que se encontra o mundo todo, as pessoas monolíngues encontram‐se em posições muito menos privilegiadas socialmente. Portanto, reforçamos que o comentário dessa equipe médica específica é inaceitável, e contraria as recomendações de outras equipes médicas, como a de Isabelle Rapin, Medicine Doctor, do Albert Einstein College of Medicine, Bronx, N.Y., que recomenda explicitamente que a língua de sinais seja usada como parte do programa de reabilitação auditiva de crianças implantadas.
Há muitos otologistas no exterior que fazem uso da língua de sinais em apoio a programas de reabilitação auditiva. Isso é recomendado explicitamente na Enciclopédia Médica de Swaiman, K. F. (1994). Pediatric Neurology: Principles and practices (2nd ed.), St. Louis: Mosby. capítulo de Isabelle Rapin: Children with hearing impairment.
Dr. Tarcísio Arantes Leite – Universidade Federal de Santa Catarina – Coordenador do Curso de Letras Libras Presencial
Dra. Ana Claudia Baliero Lodi – Universidade Metodista de Piracicaba
Dra. Regina Maria de Souza – Universidade de Campinas
Dr. Leland MacCleary – Universidade de São Paulo
Dra. Wilma Favorito ‐ Curso Bilíngue de Pedagogia – Instituto Nacional de Educação de Surdos ‐ INES
Dra. Rossana Finau – Centro Federal de Educação Teconologica do Paraná
Dra. Marianne Stumpf – Universidade Federal de Santa Catarina – Coordenadora do Curso de Letras Libras EAD e Representante da Federação Mundial de Surdos
Ms. Myrna Salerno Monteiro – Universidade Federal do Rio de Janeiro
Dra. Maria Cristina Pereira – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo ‐ DERDIC
Dra. Ana Regina e Souza Campello – Universidade Federal de Santa Catarina – Professora e Pesquisadora de Libras
Dr. Fernando Capovilla – Universidade de São Paulo ‐ PhD em Psicologia e livre‐docente em Neuropsicologia Clínica
Dra. Maria Cecília de Moura ‐ Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
Dra. Sandra Patrícia do Nascimento – Secretaria de Educação do Distrito Federal (SEEDF), Colaboradora na FENEIS‐DF
Dra. Clélia Regina Ramos ‐ Membro do Comitê Brasileiro de Tecnologia Assistiva da CORDE e Pesquisadora Associada do PACC (Programa Avançado de Cultura Contemporânea) da Universidade Federal do Rio de Janeiro
Dra. Ronice Müller de Quadros – Universidade Federal de Santa Catarina